(Foto – Nick Iwanyshyn)
O Canadá é conhecido pela ótima banda de rock and roll Rush, mas há mais que boa música por lá. James Santangelo, Rob Ness e Marc Johnson, da Universidade de Toronto, realizaram feitos notáveis: eles reuniram 288 cientistas de 26 países em um projeto de pesquisa de escala mundial, intitulado Evolução Urbana Global, cujo acrônimo é GLUE. Essa equipe estudou uma planta cosmopolita, o trevo-branco, Trifolium repens. Milhares de trevos foram coletados em 160 cidades de cinco continentes.
Análises genéticas demonstraram que essa espécie de planta evoluiu para adaptar-se a condições ambientais específicas das cidades, isto é, populações urbanas de trevos-brancos são geneticamente distintas de populações rurais.
Os primeiros resultados do projeto GLUE foram publicados na Science, uma das revistas científicas mais importantes do mundo, em um artigo intitulado “Global urban environmental change drives adaptation in white clover”, em português, “Mudanças ambientais urbanas globais impulsionam a adaptação do trevo-branco”. Seis cientistas brasileiros são coautores do artigo na Science, dois deles da UFR (Deleon Leandro e Fabio Angeoletto).
1) Por que o artigo publicado pelos pesquisadores do GLUE na Science é tão importante? Ele demonstra inequivocamente que os humanos são uma força dominante da evolução da vida no planeta. Os seres humanos modificaram as paisagens naturais de maneiras semelhantes em todo o mundo através da construção de cidades, e demonstramos que as espécies podem se adaptar repetidamente às condições ambientais drasticamente alteradas dos ecossistemas urbanos. Isso pode ter consequências importantes para a forma como conservamos a biodiversidade, gerenciamos a disseminação de espécies invasoras e pragas que representam um risco para a saúde humana. Ademais, esse é o estudo de maior escala sobre evolução biológica em cidades já realizado, tanto geograficamente quanto no número de cientistas envolvidos. Nós criamos um modelo de como ciência colaborativa pode ser conduzida em escala global para pesquisas sobre ecologia e evolução em cidades.
2) Como os resultados do projeto GLUE podem ser aplicados à conservação da biodiversidade e à promoção da saúde humana? Muitas espécies ameaçadas de extinção ocorrem em ecossistemas urbanos, mundialmente. Compreender se essas espécies podem se adaptar ao estresse ambiental imposto pela urbanização é essencial para desenhar estratégias de manejo que possam facilitar a conservação dessas espécies. Por outro lado, muitas espécies de pragas e vetores de doenças (por exemplo, ratos) também ocorrem nas cidades e podem representar riscos à saúde humana. Saber se e como essas espécies estão se adaptando biologicamente às cidades pode nos ajudar a projetar intervenções que minimizem seus impactos no bem-estar humano.
3) Quais são os próximos passos do projeto? Nós criamos um banco de dados genéticos e ambientais imenso, e pedimos aos nossos cientistas sugestões sobre a melhor forma de aproveitá-los em projetos futuros. As ideias começaram a aparecer, e agora lançamos novos estudos que analisarão os dados existentes e eventualmente coletarão mais informações. Por exemplo, vamos pesquisar como o trevo-branco foi dispersado pelo mundo a partir de sua área nativa, o Mediterrâneo. Vamos identificar mais genes envolvidos na adaptação dessa planta aos ambientes e estudar com mais profundidade o papel da herbivoria na evolução do trevo branco em ecossistemas urbanos. Esses projetos certamente nos manterão ocupados por muitos anos e nós estamos muito entusiasmados com as novas descobertas que eles trarão!
4) Os pesquisadores do projeto GLUE não querem apenas estudar a evolução das espécies nas cidades, mas também buscam um diálogo ativo com a sociedade. De que forma está ocorrendo esse diálogo? Nossos colaboradores têm se envolvido com a sociedade e a imprensa em todo o mundo. Consideramos muito importante divulgar nossos estudos a um público mais amplo que o acadêmico. O projeto GLUE foi destaque em um documentário da Sagamedia sobre evolução urbana, intitulado “Darwin In Time Square”. Nosso artigo foi noticiado por mais de 50 agências de imprensa que incluem canais de televisão, jornais, revistas e rádio. Ele tem sido amplamente divulgado em redes sociais como o Twitter. Ademais, criamos um blog [https://blog-glue.wixsite.com/globalurbanevolution] em parceria com a UFR, para popularizar nossas descobertas. Os cientistas da nossa equipe vem realizando entrevistas semelhantes a esta em agências locais de notícias, e é um prazer falar aos brasileiros através do A TRIBUNA!
Foi incrível e inspirador ver tantos cientistas ao redor do mundo trabalhando juntos para ajudar a sociedade a entender a importância das cidades, as mudanças ambientais que elas causam e como atividades humanas estão impulsionando a evolução da vida. A evolução das espécies não acontece apenas em florestas distantes: ela está ocorrendo agora, nos nossos quintais.
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